Saturday, September 30, 2006

de corpo santa

— não posso perder a missa das cinco, não posso perder a missa das cinco. repetia quase em contas, enquanto apertava o passo em um terço.

subiu a escadaria da igreja como se fosse um anjo alado. num átimo estava no atrio. menos um sinal da cruz, alojava-se no confessionário.
contrita assistiu os preparativos iniciais. em pleno sermão masturbou-se gozando em comunhão com o espírito santo. antes de correr para receber a hóstia, enfiou os dedos na buceta e lambeu os dedos quase gargarejando. uma espécie de preparação de consagrar a hóstia a sua maneira. e assim foi, hóstia deslizando-lhe a garganta, o corpo de deus, gosto de sexo, em mais que perfeita comunhão.

livre dos pecados, em casa bem na hora do jantar e antes do marido. faz-lhe a mesa com carinho e devoção. serve-lhe sopa, pão e café forte, como ele gosta. — ainda tem sobremesa do almoço, quer um pedacinho? diz-lhe carinhosamente, afagando-lhe os cabelos.

recolhe os restos do jantar, forra a mesa, coloca o jarro com planta de plástico e lava os pratos. religiosamente como faz desde que casou há 3 anos. verifica todas as portas, apaga as luzes da sala, liga a luz do quintal e só então vai assear-se para dormir, apesar de sentir-se completamente limpa.

camisola perfumada, cabelos pretos molhados, e um colo que revela seios como sinos a provocar badalos. cheiro de sexo no ar. marido nem quer saber mais de futebol, desliga a televisão bem na hora da cobrança de um penalty, pensando ele em marcar o seu. ajeita as bolas na marca da cobrança, quando ela investe-se de juiz e não autoriza a cobrança. diz-lhe da dor de cabeça: — não vê que hoje eu nem rezei? argumentação infalível, fazendo da bíblia e do terço que ao diálogo assistem, quase testemunhas de jeová.

há que consentir o marido em dormir com o saco cheio. sabe desde o noivado que ela não vive sem reza e sem comunhão. e se dor assim, não a deixa nem rezar, já hábito preparativo para os finalmente, não iria ele forçar o caminho do gol, deus me livre, de coisa assim não abençoada.

ganha dos cabelos molhados beijo de boa noite. e adormece como um anjo ao lado daquele corpo que tem o gosto de deus.

4 comments:

Anonymous said...

celso, meu velho, esse entra numa futura antologia. texto abençoado falou!

Alex Camilo said...

Estou gostando muito dessa série blasfema, fomenta daqueles olhares meio pecaminosos nos leitores. Mas só para não abrir mão do meu direito inalienável de ser chato, tenho 2 observações a fazer: 1 - Anjo Alado não só parece redundante como é uma metáfora indígna do seu talento(será que eu peguei muito pesado dessa vez?); 2 - Em "num átimo estava no atrio", parece que seu "Eu Publicitário" andou novamente fazendo cama de gato pro seu "Eu Lírico". De resto, gostei muito de tudo isso e espero incursões por outras vertentes religiosas. Quem mandou dar corda? rs

um abraço

celso muniz said...

e lá vamos nós discutir o sexo dos anjos.

realmente, anjo alado, mais do que uma redundância, é um vício de linguagem (coitados dos anjos caídos) inadmissível para um pretenso criador de poiésis.

já átimo com atrio, não incomoda o publicitário, apesar dele não estar mais pagando contas.

e quanto a pegar pesado, está mais para peso-leve do que para peso-pesado... ôops! olha mais uma redundância aqui.

enfim, leitores, como diriam os escritores e vice-versa.
por isso mesmo muito agradecido pela leitura. afinal, se o escritor não tem qualidade e seus leitores tem, nem tudo está perdido entre palavras e tréplicas.

Alex Camilo said...

Esse upercut quase me pega na taba do queixo, mas como sou peso leve mermo deu pra esquivar num boa, rs.

uma abraço